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22 março 2021

Oceanos de plástico: um dos desafios da Década da Ciência Oceânica

O ano de 2021 deu início à Década do Oceano, cujo propósito é o desenvolvimento da ciência para apoiar os países a gerenciarem os oceanos de forma sustentável e, especialmente, para alcançar os compromissos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável [1], com foco no Objetivo 14Um dos eixos do mencionado objetivo é a prevenção e redução significativa da poluição marinha de todos os tipos, incluindo-se aqui a poluição por plásticos, que representa uma das principais ameaças à vida marinha na atualidade. 

Embora os riscos e prejuízos decorrentes do consumo excessivo de plásticos, principalmente os descartáveis, sejam relativamente difundidos na sociedade, sua utilização não só está longe de acabar, como também teve um grande aumento durante a pandemia do coronavírus, com a intensificação do comércio eletrônico e do uso de material hospitalar descartável [2]Infelizmente, uma considerável parcela desse lixo produzido chega aos oceanos e, devido à sua lenta decomposição, permanecem neles por séculos, causando severos danos ao meio ambiente marinho.  

Uma pesquisa realizada pela agência científica australiana CSIRO’s Ocean and Atmosphere, publicada em outubro de 2020, estima que há 14 milhões de toneladas de microplásticos no fundo do oceano [3]Esses fragmentos, que medem menos de 5 milímetros, são altamente nocivos para os seres vivos, podendo afetar o crescimento, a reprodução, o desenvolvimento e a sobrevivência dos organismos marinhos, apesar de ainda não ser possível quantificar a dimensão de seus efeitos nos ecossistemas e na biodiversidade.  

Além dos microplásticos, os oceanos ainda contam com uma quantidade incalculável de embalagens, sacolas, garrafas e outros resíduos e objetos feitos desse material, que chegam aos mares de diversas maneiras. Dentre as várias fontes de poluição marinha por plásticos, destacam-se o lixo que é deixado nas praias e nas cidades, pois estes eventualmente acabam em rios que desaguam nomaresa pesca fantasma, que é o abandono de equipamentos de pesca nos oceanos, e os produtos cosméticos, como esfoliantes, que possuem microesferas de plásticoque após o uso são levadas pelo esgoto até os cursos d’água e mares. 

Os plásticos são ingeridos pelos animais aquáticos tanto acidentalmente, quanto voluntariamente, já que são facilmente confundidos com alimentos. Segundo especialista do Instituto Real Holandês de Pesquisas Marítimas, isso ocorre porque dentro do oceano os plásticos adquirem cheiro (e até mesmo gosto) de comida para esses animais [4]. Dessa forma, são rapidamente inseridos na cadeia alimentar, passando a integrar não só a dieta da fauna marinha, como também das aves e de outros animais que dela se alimentam, incluindo os seres humanos 

Apesar de o volume de plástico nos oceanos estar aumentando de forma alarmante com o passar dos anos, deixando os animais cada vez mais vulneráveis às consequências da poluição, 16Estados já se comprometeram com a proteção e a preservação do meio marinho, com a ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), que possui uma parte exclusiva para tratar sobre o assunto 

Todavia, cumpre ressalvar que a Convenção trata do tema de forma genérica, impondo apenas deveres gerais de preservação do ambiente marítimo, sem regulamenta-la por completo. Por isso, é essencial que a comunidade internacional celebre acordos específicos para dispor sobre a prevenção e mitigação das variadas fontes de poluição [5]. Ressalta-se que a implementação das normas de direito internacional que versam sobre a conservação e a utilização sustentável dos oceanos, conforme refletido na CNUDM, é também um dos eixodo Objetivo 14 e é extremamente urgente e necessária para que seja possível alcançar o futuro que queremos. 

Conforme se observa, a questão dos plásticos nos oceanos é um problema global e, portanto, não pode ser combatida isoladamentesendo imprescindível a cooperação dos Estados para a adoção de medidas que visem a reciclagem e a redução do consumo e do despejo de plásticos nos oceanos. Tal cooperação é, por sorte, abordada na Convenção, a qual determina que os Estados devem cooperar para promover estudos sobre a poluição do meio marinho e, à luz das informações obtidas, desenvolver práticas e procedimentos recomendados para prevenir, reduzir e controlar essa poluição. 

Para além da atuação conjunta, os Estados também devem agir individualmente para reduzir a emissão de substâncias nocivas no meio marinho, especialmente as não degradáveis, como é o caso dos plásticos, bem como reduzir a poluição proveniente de embarcações e de instalações e dispositivos que funcionem no meio marinho, nos termos do artigo 194 da Convenção. Esta ainda determina que os Estados adotem leis e regulamentos para controlar a poluição do meio marinho, assim como adequem suas políticas a essa finalidade.  

Insta destacar que a Convenção salienta que as medidas tomadas pelos Estados para combater essa poluição não devem transferir os danos ou riscos de uma zona para outra, seja direta ou indiretamente, e nem transformar um tipo de poluição em outro. Desse modo, o desenvolvimento da ciência oceânica torna-se ainda mais fundamental para que sejam alcançadas soluções efetivas para o problema dos plásticos, permitindo que seja dado um fim adequado aos que já se encontram no meio ambiente e que seu uso seja devidamente substituído por materiais biodegradáveis, sendo esse um dos principais desafios destgeração.


Referências: 

[1] Disponível em: http://decada.ciencianomar.mctic.gov.br/decada-global/ Acesso em 22 de fev. de 2021. 

[2] Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-55131470 Acesso em 22 de fev. de 2021. 

[3] Disponível em:https://www.csiro.au/en/News/News-releases/2020/14-million-tonnes-of-microplastics-on-seafloor Acesso em 22 de fev. de 2021. 

[4] Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-45519251 Acesso em 22 de fev. de 2021. 

[5] ZANELLA, Tiago V. Manual de Direito do Mar. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019. 

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