O 10º Plano Setorial para os Recursos do Mar
Por Marcelo Neves
Após um pequeno período de afastamento na Coluna do IBDMAR em decorrência de outros compromissos de agenda profissional, ao retornar não poderia deixar de comentar sobre um fato relevante ocorrido no mês passado: a aprovação do 10º Plano Setorial para os Recursos do Mar (PSRM) por meio do Decreto nº 10.544, publicado no Diário Oficial da União em edição de 16 de novembro[1], coincidentemente, ou melhor, diria que propositalmente, na data em que se comemora o dia da Amazônia Azul[2].
O PSRM é o desdobramento, a nível operacional, da Política Nacional de Recursos do Mar (PNRM), e define diretrizes, prioridades e medidas que orientam o desenvolvimento racional e sustentável de atividades de exploração e aproveitamento dos recursos renováveis, não-renováveis e energéticos das águas jurisdicionais brasileiras, que compreendem o Mar Territorial, a Zona Econômica Exclusiva e a Plataforma Continental em toda a sua extensão.
O 10º PSRM inova ao enfatizar o desenvolvimento sustentável, incorporando conceitos como a Economia Azul, Planejamento Espacial Marinho e Cultura Oceânica[3], priorizando a conservação e o uso sustentável da biodiversidade marinha aliada ao desenvolvimento científico, tecnológico e econômico para as presentes e futuras gerações. Outros fatores que se podem destacar como positivos são a inclusão da retomada de pesquisas na cordilheira mesoatlântica para exploração de sulfetos polimetálicos e a celebração de um novo contrato com a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos[4], a implementação do Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar e a criação da ação Promoção da Mentalidade Marítima, com o objetivo de fortalecer o interesse da população brasileira pelo mar, com projetos, atividades e parcerias que abordam a conservação e o uso racional e sustentável dos recursos do oceano do País.
O PSRM define mentalidade marítima como elemento intangível que deve ser fomentado na sociedade brasileira e fortalecido nos atores marítimos e consiste no grau de conscientização da sociedade e dos decisores governamentais sobre a importância do poder marítimo e de seus elementos constituintes para a vida da nação, bem como o sentimento de pertencimento dos homens e das mulheres do mar à comunidade marítima brasileira, cuja interação sinérgica favorece a ampliação desse poder em prol dos interesses nacionais.
Analisando todos os seus 22 objetivos[5], fica evidente que que o PSRM se coaduna com os Objetivos da Década dos Oceanos e com a Agenda 2030. Não poderia ser diferente. O Brasil, por ser um país predominantemente oceânico, com 17 Estados litorâneos, com quase 300 municípios distribuídos ao longo de seus aproximados 8.500 km de costa, não pode virar as costas para o mar. A conservação dos ecossistemas marinhos localizados em nossos 5,7 milhões de km² e no restante do Atlântico Sul é medida que se impõe, pois são estratégicos para o nosso país.
Desenvolver a prospecção mineral em águas profundas, promover a utilização racional do potencial biotecnológico da biodiversidade marinha, buscando o cumprimento das metas estabelecidas pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e desenvolver o conceito de Amazônia Azul e o uso eficiente, harmônico e sustentável de suas riquezas coloca o Brasil em posição de vanguarda em todo o hemisfério sul, colaborando para uma maior inserção no cenário internacional.
[1] Disponível em https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10.544-de-16-de-novembro-de-2020-288552390. Acesso em 17 dez. 2020.
[2] O dia da Amazônia Azul foi instituído pela Lei nº 13.187, de 11 de novembro de 2015. A data escolhida, 16 de novembro, faz homenagem ao dia em que a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar entrou em vigor.
[3] Disponível em https://www.gov.br/defesa/pt-br/assuntos/noticias/dia-nacional-da-amazonia-azul-e-celebrado-com-assinatura-de-decreto#:~:text=Bras%C3%ADlia%20(DF)%2C%2016%2F,para%20os%20Recursos%20do%20Mar. Acesso em 17 dez. 2020.
[4] O Brasil solicitou a rescisão do contrato celebrado para exploração da Elevação do Rio Grande, tendo em vista a inclusão dessa área no pedido feito em dezembro de 2018 para sua incorporação da Plataforma Continental Brasileira. Maiores informações a respeito desse pedido podem ser consultadas em http://www.ibdmar.org/2020/11/remarks-on-brazils-decision-to-terminate-its-sponsorship-for-its-state-company-in-contract-with-the-international-seabed-authority/
[5] Os objetivos do X PSRM são estabelecidos de modo a atender aos interesses político-estratégicos do País no mar, tanto em âmbito nacional quanto internacional, com vistas a ampliar a presença brasileira na Amazônia Azul e em suas ilhas oceânicas, bem como em áreas marítimas internacionais de interesse. À luz desses princípios, são objetivos do X PSRM: a) contribuir para a consecução dos objetivos brasileiros estabelecidos pela PNRM; b) promover a pesquisa científica, o desenvolvimento tecnológico, a conservação e o uso sustentável dos recursos vivos e não vivos e os sistemas de observação e monitoramento dos oceanos, ampliando a presença brasileira na Amazônia Azul e em áreas marítimas internacionais de interesse; c) estabelecer as bases científicas e as ações integradas capazes de subsidiar políticas, ações e estratégias de conservação e uso sustentável da biodiversidade; d) promover o desenvolvimento sustentável da pesca e da aquicultura como fonte de alimentação, emprego, renda e lazer, garantindo-se o uso sustentável dos recursos pesqueiros, bem como a otimização dos benefícios econômicos decorrentes, em harmonia com a preservação e a conservação do meio ambiente e da biodiversidade; e) contribuir para a redução das vulnerabilidades ambientais, sociais e econômicas da zona costeira; f) ampliar, consolidar e integrar sistemas de monitoramento da estatística pesqueira e aquícola marinha, incluindo dados de captura e esforço de pesca por espécie, além de monitorar a condição de explotação dos principais estoques; g) promover estudos e pesquisas para ampliar o conhecimento e a avaliação dos recursos vivos, visando ao desenvolvimento do uso sustentável do potencial biotecnológico e energético desses recursos; h) promover estudos e pesquisas do potencial mineral da plataforma continental e dos fundos marinhos internacionais, para ampliar o conhecimento, a avaliação e o desenvolvimento do uso sustentável dos recursos minerais marinhos, visando, também, à aquisição do direito de exploração e explotação mineral em áreas internacionais de interesse; i) ampliar e consolidar sistemas de monitoramento dos oceanos, da zona costeira e da atmosfera adjacente, incluindo a instalação de observatórios meteoceanográficos, a fim de aprimorar o conhecimento científico e contribuir para reduzir vulnerabilidades e riscos decorrentes de eventos extremos, de forma a propiciar respostas às situações emergenciais; j) fomentar a criação de bancos de dados e sistemas integrados e aprimorar aqueles existentes para disponibilização dos dados meteoceanográficos e dos recursos naturais marinhos coletados e produzidos no âmbito do PSRM para acesso público, promovendo a inclusão de sistemas destinados à coleta de dados biogeoquímicos, biológicos e dos ecossistemas oceânicos; k) estimular o aprimoramento dos sistemas existentes para disponibilização de dados sobre os ambientes marinhos para acesso público; l) incentivar as instituições ligadas às Ciências do Mar a fornecerem os dados e metadados coletados em expedições realizadas pela comunidade científica nacional ao Banco Nacional de Dados Oceanográficos e ao Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira; m) estimular a formação continuada de recursos humanos em Ciências do Mar e em atividades relacionadas aos oceanos; n) fomentar o desenvolvimento de tecnologias e a produção nacional de materiais e equipamentos necessários às atividades de pesquisa, monitoramento e exploração no mar; o) contribuir para a atualização da legislação brasileira, visando à sua aplicação em todos os aspectos concernentes aos recursos do mar, à gestão integrada das zonas costeiras e oceânicas e aos interesses marítimos nacionais; p) promover o estabelecimento do uso compartilhado do ambiente marinho no País, por meio da implementação do Planejamento Espacial Marinho; q) contribuir para o desenvolvimento e a consolidação de uma economia azul no País com bases sustentáveis; r) incentivar as instituições componentes da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, bem como os seus órgãos subordinados e pares nas demais esferas de governo, a armazenarem ou compartilharem os seus dados geoespaciais e metadados na Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais, em cumprimento ao disposto no Decreto nº 6.666, de 27 de novembro de 2008, em proveito do desenvolvimento do País; s) contribuir para a implementação, no País, das metas do Objetivo do Desenvolvimento Sustentável nº 14 (Vida na Água) da Agenda 2030; t) contribuir com as políticas voltadas à redução da poluição de resíduos sólidos nos oceanos; u) estimular e fortalecer a consolidação de mentalidade marítima junto à sociedade brasileira e contribuir para o desenvolvimento no País de uma cultura oceânica (ocean literacy); e v) estimular o estabelecimento de parcerias, nacionais e internacionais, para desenvolver pesquisas, qualificação de pessoal e transferência de tecnologia, assim como possibilitar o aporte de recursos extraorçamentários, como, por exemplo, aqueles provenientes de projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica.