Japão decide soltar o esgoto de Fukushima no Oceano Pacífico
Em Abril, o Governo japonês anunciou para o mundo seus planos de gradualmente soltar toneladas de esgoto da das ruínas da usina nuclear Fukushima Daiichi para o oceano.[1] Os prédios dos reatores na usina de Fukushima foram danificados por explosões de hidrogênio após o terrível tsunami que atingiu a região em 2011.[2] Para evitar que os três reatores danificados derretam, uma água refrigerada é bombeada através deles continuamente and um intenso sistema de filtragem se assegura de remover todos materiais radioativos da água bombeada, com a exceção do trítio, que, em pequenas doses, não faz mal para a saúde humana.[3] Atualmente, mais de um milhão de toneladas de água já foram usadas para resfriar os reatores e estão armazenadas em mais de 1,000 tanques no local da usina. No entanto, o operador da usina está ficando sem espaço, com os tanques tendo a expectativa de estarem cheios até 2022.[4] É esperado que a soltura completa deste esgoto demore décadas.[5]
O Primeiro-Ministro japonês, Yoshihide Suga, disse durante uma reunião do gabinete que a disposição da água armazenada na usina era “um problema que não poderia ser evitado” e que o Governo Japonês irá “tomar todas medidas para assegurar absolutamente a segurança da água tratada e para endereçar a má-informação”. Contudo, desde o anúncio da iniciativa do Japão de soltar o esgoto no oceano, várias críticas foram feitas por Estados e grupos não-Estatais.
O Greenpeace, por exemplo, tem sido um objetor longínquo da ideia de liberar o esgoto no oceano e, em um relatório de 2020, a organização apontou também para o perigo de haver carbono-14 na água. De acordo com o estudo “Com uma meia-vida de 7,730 anos, o carbono-14 é um grande contribuidor para a dose coletiva humana global; uma vez introduzido no meio-ambiente, o carbono-14 será entregue para populações locais, regionais e globais por muitas gerações”[6]. Notavelmente, após o pronunciamento do Governo japonês, o Greenpeace declarou que a decisão “ignora direitos humanos e o direito internacional marítimo”.[7]
Nesse sentido, Currie e Burnie destacam que “Antes de qualquer descarga no Oceano Pacífico, é requerido que o Japão conduza um Estudo sobre o Impacto Ambiental sob o Artigo 206 da [Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar] UNCLOS”.[8] Ademais, o Japão possui outros deveres dentro do Direito Internacional como as obrigações de não causar dano ambiental transfronteiriço significativo e de procurar por outras opções viáveis, que podem servir como uma alternativa para a decisão de despejar o esgoto no mar.[9]
Em adição, a declaração do Japão causou desconforto em outros Estados da região, como a China e a Coréia do Sul. O presidente da Coréia do Sul, Moon Jae-In, ordenou seus oficiais a começarem a procurar maneiras de referir o movimento japonês para o Tribunal Internacional para o Direito do Mar.[10] Outrossim, o “Partido da Justiça” coreano, de oposição progressista, junto com outros grupos, se referiu ao plano do Japão como “terrorismo nuclear”.[11]
Em relação ao Governo chinês, Zhao Lijian, um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, desafiou a administração Japonesa a provar que a água é realmente segura, bebendo-a.[12] Além disso, ele afirmou fortemente que “o oceano não é uma lata de lixo do Japão”. Li Shouping, diretor da Faculdade de Direito do Instituto de Tecnologia de Pequim, também disse que, baseado na Convenção das Nações Unidas para o Direito do Mar, a ilegalidade da decisão do Japão é indiscutível.[13]
Em consequência, parece que se o Japão decidir realmente seguir com seu plano de despejar o esgoto no Oceano Pacífico, um litígio internacional pode ser iniciado pela Coréia do Sul ou pela China. Não obstante, independente dos próximos passos Japoneses, considerando que a atual solução de armazenar o esgoto deve ser apenas uma solução temporária, uma decisão terá de ser feita no que concerne ao futuro deste entrave. O Greenpeace, por exemplo, sugere que o Japão deve atrasar o início das descargas porque, levando em consideração a curta meia-vida do trítio (12 anos e 3 meses), isso naturalmente iria diminuir o impacto no ambiente.[14] No entanto, em relação à legalidade das ações do Japão, parece que nos próximos meses nós devemos ter a Corte Internacional de Justiça ou o Tribunal Internacional para o Direito do Mar sendo chamados para emitir suas opiniões sobre o assunto. Certamente, os principais capítulos desta história ainda estão para se desdobrar.
Por Augusto Guimarães Carrijo, graduando em Direito na Universidade Federal de Uberlândia, sob a orientação do Dr. Felipe Kern Moreira, diretor do IBDMAR.
[1] DOOLEY, Ben; JETT, Jennifer. Fukushima Wastewater Will Be Released into the Ocean, Japan Says. The New York Times. New York, 12 Apr. 2021. Available at: https://www.nytimes.com/2021/04/13/world/asia/japan-fukushima-wastewater-ocean.html#:~:text=the%20main%20story-,Fukushima%20Wastewater%20Will%20Be%20Released%20Into%20the%20Ocean%2C%20Japan%20Says,damaged%20reactor%20cores%20from%20melting
[2] BBC. Fukushima: Japan approves releasing wastewater into ocean. In: BBC. BBC news. London, 12 Apr. 2021. Available at: https://www.bbc.com/news/world-asia-56728068 .
[3] DOOLEY, Ben; JETT, Jennifer. Fukushima Wastewater Will Be Released into the Ocean, Japan Says. The New York Times. New York, 12 Apr. 2021. Available at: https://www.nytimes.com/2021/04/13/world/asia/japan-fukushima-wastewater-ocean.html
[4] BBC. Fukushima: Japan approves releasing wastewater into ocean. In: BBC. BBC news. London, 12 Apr. 2021. Available at: https://www.bbc.com/news/world-asia-56728068.
[5] DOOLEY, Ben; JETT, Jennifer. Fukushima Wastewater Will Be Released into the Ocean, Japan Says. The New York Times. New York, 12 Apr. 2021. Available at: https://www.nytimes.com/2021/04/13/world/asia/japan-fukushima-wastewater-ocean.html.
[6] GREENPEACE. The reality of the Fukushima radioactive water crisis. Stemming the tide 2020, Oct. 2020. Available at: https://storage.googleapis.com/planet4-japan-stateless/2020/10/5768c541-the-reality-of-the-fukushima-radioactive-water-crisis_en_summary.pdf.
[7] GREENPEACE. The Japanese government’s decision to discharge Fukushima contaminated water ignores human rights and international maritime law. In: GREENPEACE. Greenpeace International. 13 Apr. 2021. Available at: https://www.greenpeace.org/international/press-release/47207/the-japanese-governments-decision-to-discharge-fukushima-contaminated-water-ignores-human-rights-and-international-maritime-law/.
[8] CURRIE, Duncan; BURNIE, Shaun. Japan’s plan for radioactive water defies international law. The Korea Times. South Korea, 09 Mar. 2020. Available at: https://www.koreatimes.co.kr/www/nation/2020/07/371_285553.html.
[9] Ibidem. See also: INTERNATIONAL LAW COMMISSION. Draft Articles on Prevention of Transboundary Harm from Hazardous Activities, with commentaries. 2001. Available at: https://legal.un.org/ilc/texts/instruments/english/commentaries/9_7_2001.pdf.
[10] REUTERS. S. Korea aims to fight Japan’s Fukushima decision at world tribunal. In: REUTERS. Reuters. London, 14 Apr. 2021. Available at: https://www.reuters.com/world/asia-pacific/skoreas-moon-seeks-international-litigation-over-japans-fukushima-water-decision-2021-04-14/.
[11] Ibidem.
[12] TAYLOR, Adam. China to Japanese official: If treated radioactive water from Fukushima is safe, ‘please drink it’. The Washington Post. Washington, 14 Apr. 2021. Available at: https://www.washingtonpost.com/world/2021/04/14/china-japan-fukushima-water-drink/.
[13] JINCUI, Yu. China should actively consider legal battle against Japan’s wastewater plan: experts. Global Times. Beijing, 17 Apr. 2021. Available at: https://www.globaltimes.cn/page/202104/1221303.shtml.
[14] GREENPEACE. The reality of the Fukushima radioactive water crisis. Stemming the tide 2020, Oct. 2020. Available at: https://storage.googleapis.com/planet4-japan-stateless/2020/10/5768c541-the-reality-of-the-fukushima-radioactive-water-crisis_en_summary.pdf.