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15 abril 2021

Seaspiracy é necessário (contém spoilers)

Por Carolina Vicente Cesetti Doutoranda em Direito pela Universidade de Brasília Pesquisadora do Grupo de Estudos de Direito, Recursos Naturais e Sustentabilidade (GERN/UnB).

 

No dia 24 de Março de 2021 o documentário Seaspiracy[1] estreiou na Netflix e, há uma semana atrás, entrou em primeiro lugar da lista de filmes mais assistidos na Inglaterra, bem como já faz parte da lista de 10 filmes mais vistos do Streaming em vários países. Em apenas duas semanas um tema de extrema relevância se tornou mais acessível por meio deste documentário. Há muitas cenas chocantes que causam reflexão aos telespectadores, por isso a necessidade de assistir. Porém, este breve texto não tem objetivo de fazer um resumo sobre o documentário, e sim de analisar os pontos trazidos, bem como os contrapontos e as reações do setor sobre as informações expostas.

 

Ao longo do filme, uma das grandes críticas feitas é referente à pesca industrial ser extremamente predatória e prejudicial ao meio ambiente marinho, o que é uma realidade que precisa ser modificada. O documentário aponta que a solução principal é que haja o fim do consumo de peixes, enfraquecendo, assim, este tipo de pesca. É possível deduzir que esta solução é magnifica, porém distante da realidade atual. A pesca envolve a indústria, os trabalhadores do setor, os consumidores, as populações tradicionais, os animais marinhos e seu meio ambiente. É uma gama de variáveis que devem ser levadas em consideração.

 

As cenas mais chocantes e revoltantes do documentário são: a caça aos golfinhos pelo fato deles se alimentarem dos peixes que os pescadores pescam; trabalhos análogos à escravidão em navios; a caça brutal às baleias; a produção de lixo marinho resultante do abandono de equipamentos de pesca no mar; e a falta de confiabilidade de selos sustentáveis. Ainda assim, sem o trabalho do Estado e das Organizações Internacionais e Organizações Internacionais Não Governamentais, o cenário poderia ser ainda mais catastrófico. Claro que existe um longo caminho para a regulamentação da atividade pesqueira no mar, todavia, seria injusto não reconhecer o esforço dos sujeitos internacionais de Direito Internacional Público e seus atores.

 

O documentário citou ONGs que fazem um trabalho de destaque, foram elas a Sea Shepherd[2] e a Environmental Justice Foundation[3]. Outras foram criticadas duramente, como a famosa Oceana, todavia, a Oceana se manifestou acerca das alegações trazidas pelos produtores de Seaspiracy. Em sua declaração[4] a Oceana afirma que é possível salvar os oceanos e alimentar o mundo, acrescenta que as campanhas que realiza em diversos países atualmente já fazem parte de 28% da pesca mundial. Salienta seus progressos em campanhas acerca da interrupção da captura acidental, pesca ilegal, destruição de habitat, perda de biodiversidade, poluição por plástico e perfuração de petróleo offshore, entre outros. Finaliza dizendo que as campanhas são para proteger animais e vidas marinhas, bem como as pessoas que dependem do oceano para sobrevivência.

 

É inegável a relevância das informações e da exposição da situação atual da pesca industrial no mundo para que haja maior conscientização. Desta forma, o documentário promove a Cultura Oceânica (Ocean Literacy) que é um convite para escolas; empresas; ONGs; governos; universidades; comunidades; cidadãos; todos e cada um de nós, para reconhecer o papel do oceano em nossas vidas, para falar sobre sua importância, reconhecer nossa influência sobre o oceano, pensar em nossos comportamentos e propor ações, políticas públicas e ferramentas inovadoras que ajudem a conservar o oceano e garantir a qualidade de vida das gerações futuras[5]. Para que isso seja possível, a ciência precisa ser ouvida e todos os meios de soluções que sejam tangíveis para o maior número de  países, levando em consideração suas realidades.

 

Outro aspecto, é refletir acerca do papel do Direito do Mar e dos juristas da área neste debate. O Direito tem a incessável função de acompanhar a evolução da sociedade, é um trabalho sempre inacabado uma vez que a evolução é constante. Na seara marinha, percebe-se um esforço dos sujeitos internacionais de regularem esta complexa matéria, desde a Proclamação Truman em 1945 sobre a Zona Pesqueira e Plataforma Continental. Em seguida, houve a Conferência de 1958 sobre Direito do Mar que regulou o Mar Territorial, Zona Contigua, Plataforma Continental, Alto Mar e sobre a Pesca e a conservação dos recursos biológicos do Alto Mar. Até 1982 quando houve a aprovação do texto da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar e até hoje, várias normas são criadas com o intuito de desenvolver a matéria. Sendo assim, é possível destacarmos conceitos e obrigações legais vindas desses textos normativos internacionais que visam fortalecer a segurança jurídica do Direito do Mar. Contudo, o documentário não mencionou a existência dos mesmos. Ainda assim, os produtores não poderiam tratar de todos os assuntos e há muita relevância no conteúdo do filme, que é necessário para que haja mais debate e desenvolvimento do tema.

 

[1] SEASPIRACY (Disponível na Netflix): https://www.imdb.com/title/tt14152756/ Acesso em 10 de abr. de 2021.

[2] Disponível em: https://seashepherd.org.br/ Acesso em 10 abr. de 2021

[3] [3]Disponível em: https://ejfoundation.org/ Acesso em 10 abr. de 2021

[4] Disponível em: https://oceana.org/statement-oceana-netflixs-seaspiracy?utm_campaign=2021&utm_source=hpib1&utm_medium=website&utm_id=KEJa8EEtnPexxi Acesso em 10 abr. de 2021

[5]Disponível em: http://www.unesco.org/new/pt/rio-20/single-view/news/unesco_launches_ocean_literacy_programme_in_brazil/ Acesso em 10 abr. de 2021.

 

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