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08 abril 2021

O Canal de Suez está liberado, mas os impactos do Ever Given serão sentidos por muito tempo

Por Carla Adriana C Gibertoni Fregona, Advogada e consultora jurídica, Sócia do escritório Pádua Advogados, Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Barcelona, Autora do livro Teoria e Prática do Direito Marítimo, Professora convidada em cursos de Pós graduação em Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro.

Recentemente, um navio porta-contêiner de 1.300 pés de comprimento, com quase 60 metros de largura e 219.000 toneladas, impediu centenas de outras embarcações de usar o Canal de Suez, uma das vias navegáveis mais importantes do mundo, depois de ser desviado da rota habitual por ventos fortes.[1]

O gigante navio porta-contêineres Ever Given, de propriedade de uma empresa japonesa, operada por um transportador taiwanês e com bandeira do Panamá, não está mais bloqueando o Canal de Suez, onde ficou por sete dias. Mas o impacto e as consequências para o comércio internacional e a logística de abastecimento provavelmente durarão muito mais tempo.

O bloqueio gerou muita preocupação e frustração para a indústria de navegação global. Afinal, estamos passando por momentos difíceis nos negócios que dependem do transporte e abastecimento. O Brexit. A pandemia. O congestionamento nos principais portos.

O Ever Given deixou mais de 400 navios, transportando de tudo, desde petróleo bruto até gado, aguardando, em cada extremidade do canal, o navio de contêiner encalhado ser reflutuado.[2]

Nos últimos meses, assistimos a um aumento significativo nas taxas de frete globais, uma vez que a produção e o consumo se recuperavam de suas baixas causadas pela pandemia. A economia global começou a mostrar sinais de recuperação.

Isso significa que qualquer atraso representa um custo significativamente alto.

Os atrasos elevam ainda mais os custos, além de diminuir a oferta de embarcações disponíveis. Esses fatores devem pressionar o frete marítimo, encarecendo de forma generalizada o preço dos produtos transportados pelo mar.

O Canal de Suez é uma passagem marítima vital para as cadeias de abastecimento em todo o mundo. Mas não é a única. Uma das rotas alternativas, passando ao redor do Cabo da Boa Esperança, leva quase nove dias a mais. Com isso, a crise obrigou as empresas a escolher entre esperar ou redirecionar os navios pela África, o que aumenta a conta de combustível, 9.000 quilômetros (5.500 milhas) e mais de uma semana de viagem entre a Ásia e a Europa.[3]

É certo que algumas mercadorias nos navios atrasados estragaram ou se tornaram inúteis. Por outro lado, seguros e demandas legais de empresas cujas embarcações atrasaram e tiveram embarques interrompidos provavelmente continuarão por muito tempo.

Evidentemente, a causa impactará as responsabilidades legais do navio e os interesses da carga. Os encargos que irão recair sobre o proprietário da embarcação e as seguradoras incluem a perda de receitas associadas à carga do navio e os prejuízos de outros navios cuja passagem foi impedida pelo incidente.

A Europa deve ser a região que sentirá o maior impacto. As empresas localizadas na Ásia serão afetadas não apenas pelo atraso dos embarques da Europa, mas também pela escassez de contêineres vazios retornando para sua região.

É certo que o bloqueio do Canal de Suez não afeta apenas a indústria de navegação global ou a economia egípcia – inúmeros negócios também são afetados.

Dentre eles, o setor de combustíveis, já que o Canal de Suez é uma importante rota para barris de petróleo que vêm do Oriente Médio.[4] Outros diversos setores devem ser atingidos já que são os produtos transportados pelo Canal de Suez vão desde grãos a roupas de bebê e artigos esportivos, passando até por equipamentos cirúrgicos.

No Brasil, há uma preocupação quanto aos contêineres refrigerados, que transportam carnes, frutas, produtos farmacêuticos e outros.

Se as autoridades corporativas precisavam de algo para lembrá-las sobre a importância de preparar ou atualizar seus planos de gestão de crises nestes tempos incertos, as manchetes sobre o navio encalhado devem ter sido suficientes para tornar seus planos uma prioridade máxima – quer eles dependam de cadeias logísticas de abastecimento ou não.

O incidente do Canal de Suez nos dá um grande motivo para as empresas investirem em dados e tecnologia para criar uma cadeia logística mais ágil e geograficamente dispersa que possa girar rapidamente durante eventos inesperados.

Embora uma atenção considerável tenha se concentrado no valor econômico da carga presa em navios e sua incapacidade de se mover através do Canal de Suez, os impactos financeiros na produção, que depende da entrega pontual desses materiais são enormes. Por exemplo, quem imaginaria que o atraso de uma peça automotiva barata, mas essencial, a caminho da China pode impedir a venda de todo o veículo na Alemanha?

Embora o incidente possa ter sido um evento único, de difícil previsão, as consequências precisam ser avaliadas.  Afinal, com poucas rotas para o transporte de mercadorias ao redor do mundo, Suez ainda existirá por muito tempo.

[1] Disponível em https://www.noticiasaominuto.com/mundo/1718563/canal-do-suez-interrompido-ha-tres-dias-sem-estimativa-de-desbloqueio Acesso em 07/04/2021.

[2] Disponível em https://noticias.r7.com/internacional/congestionamento-de-navios-no-canal-de-suez-termina-apos-5-dias-03042021. Acesso em 06/04/2021

[3] Disponível em

https://www.bbc.com/portuguese/internacional-56601306. Acesso em 06 de abril de 2021.

[4] Disponível em https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/03/26/navio-encalhado-ever-given-canal-de-suez-efeitos-brasil.htm. Acesso 07/04/2021.

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