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24 setembro 2020

Organização Marítima Internacional frente aos desafios dos marítimos na pandemia do Covid – 19

Por Milena Barbosa de Melo
Doutora, especialista e mestre em Direito Internacional pela Universidade de Coimbra- Portugal. Professora da Universidade Estadual da Paraíba. CEO da modular criativo. Diretora acadêmica na Agência Nacional de Estudos em Direito ao Desenvolvimento.


A pandemia do Covid-19 trouxe consigo não apenas um “novo normal”, jargão tão utilizado nos últimos dias, mas foi especialmente responsável pela maior crise humanitária deste século, visto que o vírus veio agravar as fragilidades, já existentes na sociedade, como é o caso dos refugiados, fome, desastres ambientais etc.

Com o meio ambiente marinho não poderia ser diferente e, nesse sentido, muitos foram os impactos causados com a pandemia, em especial, com o desenvolvimento do comércio no mar. O abastecimento, no mundo, de alimentos, medicamentos, matérias-primas, dentre outros produtos, é feito, em sua grande maioria, pelo meio ambiente marítimo. Contudo, para que seja possível que as embarcações naveguem, torna-se necessário o uso dos marítimos, que são os trabalhadores responsáveis por todo o processo de navegação. Sua importância é tão significativa que é necessário destacar os esforços envidados por toda a comunidade internacional (Organizações Internacionais) no sentido de proteger os marítimos, como é o caso da edição da Convenção do Trabalho Marítimo (MLC 2006).

A questão reside na restrição de viagens que foram aplicadas por vários países pelo mundo e que acabaram por deixar milhares de marítimos presos em navios, sem a possibilidade de navegar. As medidas de restrição de cada país, apesar de distintas, impossibilitaram não apenas a troca de tripulação (sistema obrigatório após 11 meses no mar), mas especialmente o retorno para casa, visto que a dificuldade de se conseguir um voo comercial, autorização para entrada e permanência em país estrangeiro dificultou, ainda mais, a vida dos marítimos, de maneira que, atualmente, é possível encontrar dezenas de milhares de profissionais presos em embarcações.

A realidade faz surgir um questionamento importante: E os marítimos ficarão à deriva, enquanto durar a pandemia do COVID-19?

É justamente com base na pergunta problema que a Organização Marítima Internacional tem envidado esforços no sentido de garantir o mínimo existencial para os marítimos, já que é de sua competência as questões que surgem no meio ambiente marinho. Por isso, vem trabalhando arduamente para que os marítimos sejam reconhecidos como “trabalhador-chave” a partir de uma comunicação a ser realizada pelos Estados membros da OMI e, ainda, pelos Estados associados. O objetivo é tão somente auxiliar o processo de substituição de marítimos (conforme a OIT) e de retorno para casa.

Dessa maneira, os países que fizerem essa publicação deverão cumprir as especificações apresentados pela OMI, onde estabelece um conjunto de medidas essenciais para garantir a segurança dos marítimos enquanto durar a pandemia do COVID-19.

Destaca-se que, esse conjunto de protocolos, não se aplica apenas às empresas que são proprietárias das embarcações, mas também para os governos e qualquer outro órgão marítimo de competência nacional. O que se pretende, tão somente, é o retorno dos marítimos com segurança.

E, muito embora, vários países tenham designado os marítimos como trabalhadores-chaves, algumas dificuldades ainda persistem, pois esta designação acaba por se aplicada apenas aos nacionais de um determinado país, restringindo os benefícios aos estrangeiros.

Sabendo-se, portanto, que a plausível saída sistematizada pela Organização Marítima Internacional em especificar os marítimos como trabalhador-chave,  fundamentada claramente no título 4 da MLC (2006) só pode ser cumprida em caso de aceitação pelo próprio País, não resta dúvidas da violação de  uma gama de Convenções Internacionais, como é o caso da Declaração Universal de Direitos do Homem e Convenção de Roma que cria o Tribunal Penal Internacional.

Deixar o marítimo à deriva, sem assistência, é ressignificar o lado mais sombrio do abandono ao indivíduo e, isso, merece sim, ser analisado por uma Corte Internacional, para que a responsabilidade seja materializada e o mundo venha a mudar de perspectiva comportamental.

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