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04 agosto 2020

MARÉ DE RESÍDUOS PLÁSTICOS NOS TEMPOS DE PANDEMIA

por Carolina Vicente Cesetti

Doutoranda e Mestre em Direito, Estado e Constituição na Universidade de Brasília. Pesquisadora do Grupo de Direito, Recursos Naturais e Sustentabilidade (GERN) da Universidade de Brasília. Professora Voluntária de Direito Internacional Público na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.

 


 

A Pandemia do COVID-19 acabou refletindo nos recursos pesqueiros de uma forma nunca vista antes[1]. Ao analisar o assunto, é possível observar o aumento da utilização de materiais de plástico, necessários para o combate ao Corona Vírus. Este aumento de resíduos plásticos, afeta diretamente o oceano bem como os recursos pesqueiros.

Conforme estudo da Ocean Conservancy[2], a poluição causada pelos resíduos plásticos afeta a atividade pesqueira uma vez que muitas espécies de peixes também consomem detritos plásticos, confundindo-os com comida de verdade. Estimou-se que pelo menos 600 espécies diferentes de animais selvagens estão ameaçadas de extinção pela poluição causada pelo lixo plástico.

Sobre a pesca, cerca de 35% a 38% da produção mundial faz parte do comércio internacional, gerando um valor de 152 bilhões de dólares em 2017 e mais de 54% desse comércio tem origem em países em desenvolvimento[3]. Segundo o relatório da FAO de 2020[4], a produção global de pesca de captura (pesca de água doce e captura marinha) atingiu novo recorde, de 96,4 milhões de toneladas, um aumento de 5% em relação à média dos três anos anteriores. Somente a pesca marinha aumentou de 81,2 milhões para 84,4 milhões de toneladas entre 2017 e 2018.

De forma breve, é importante destacar que a atividade pesqueira diminuiu em ambos setores artesanais e industriais durante o pandemia. De acordo com o Global Fishing Watch, atividade de pesca industrial global havia caído globalmente em cerca de 6,5 por cento no final de Abril de 2020, em comparação com os anos anteriores, resultado de restrições e fechamentos relacionados a COVID-19[5]. A escassez de mão-de-obra também teve um forte impacto nas atividades de pesca, principalmente quando as tripulações estão composta por trabalhadores migrantes[6] e classes menos favorecidas[7].

Devido a esta situação mundial inédita, é preciso repensar sobre a redução da maré crescente de lixo plástico que exigirá que os setores públicos e privados pensem além de sacolas e canudos. No Brasil, os esforços para a diminuição dos resíduos plásticos devem partir de um esforço integrado entre os entes federados conforme previsto no artigo 23, IV da Carta Magna de 1988[8] que prevê a competência comum para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas.

Em recente pesquisa conjunta realizada pela Universidade de Oxford, Universidade de Leeds, Fundação Ellen Macarthur e Common Seas[9] foi constatado que o plástico que entra no meio ambiente deve dobrar até 2040. Se não forem fortalecidas e implementadas ações de redução dos resíduos plásticos, mais de 1,3 bilhões de toneladas de lixo plástico serão despejadas nos oceanos. Outrossim, conforme dados da Nações Unidas extraídos dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável número 14 sobre a vida debaixo d’água[10], cerca de 40% do oceano é fortemente afetado pela poluição, esgotamento de estoques pesqueiros e perda de habitats costeiros.

O volume de plástico que entra no oceano anualmente pode quase triplicar nos próximos 20 anos e até 2050 a quantidade de plástico pode ultrapassar o número de peixes nas águas do planeta[11]. É preciso ação de todos os atores envolvidos, cada um de nós está conectado diretamente com este aumento uma vez que produzimos lixo plástico diariamente. Repensar nossa produção atual, como as formas de uso e gerenciamento de resíduos com o que será projetado no futuro pós pandemia, pode ser o próximo desafio que enfrentaremos na conservação do meio ambiente marinho.

 


[1] Disponível em: http://www.fao.org/3/ca9349en/CA9349EN.pdf Acesso em: 03 Ago. 2020.

[2] Disponível em: https://oceanconservancy.org/blog/2014/07/23/nowhere-to-hide-more-than-fish-may-be-impacted-by-plastic-pollution/#content Acesso em: 03 Ago. 2020.

[3] Disponível em: https://www.unenvironment.org/news-and-stories/story/fish-dish-securing-sustainable-future-fisheries-sector Acesso em: 03 ago. 2020.

[4] Disponível em: http://www.fao.org/3/ca9229en/CA9229EN.pdf Acesso em: 03 ago. 2020.

[5] Disponível em: https://globalfishingwatch.org/data-blog/global-fisheries-during-covid-19/ Acesso em 03 Ago. 2020.

[6] Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2020/04/22/world-bank-predicts-sharpest-decline-of-remittances-in-recent-history Acesso em 03 Ago. 2020.

[7] Disponível em: https://www.cffacape.org/news-blog/hard-hit-by-the-covid-19-crisis-ivorian-women-in-artisanal-fisheries-also-see-it-as-an-opportunity-to-address-long-postponed-issues Acesso em: 04 ago. 2020.

[8] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 04 de Ago. 2020.

[9] Disponível em: https://www.pewtrusts.org/-/media/assets/2020/07/breakingtheplasticwave_report.pdf Acesso em: 03 ago. 2020.

[10] Disponível em: https://www.undp.org/content/undp/en/home/sustainable-development-goals/goal-14-life-below-water.html Acesso em 03 de Ago. 2020.

[11] Disponível em: https://www.independent.co.uk/environment/ocean-plastic-fish-climate-crisis-sea-study-a9635241.html Acesso em 03 Ago. 2020.

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