Elevação do nível do mar e as litigâncias climáticas
por Larissa Coutinho
Doutoranda e Mestre em Direito, Estado e Constituição na Universidade de Brasília
Pesquisadora do Grupo de Direito, Recursos Naturais e Sustentabilidade (GERN) da Universidade de Brasília
“É incontrolável e está se acelerando”[1]. Foi assim que o jornal El País noticiou a aceleração do aumento do nível do mar apontada no relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) em setembro de 2019.
Desenvolvido por especialista de mais de 30 (trinta) países – a maioria de países em desenvolvimento –, o relatório do IPCC noticiou que, se nada for feito, o aumento do nível do mar decorrente do aquecimento global pode chegar a 1 (um) metro de altura nos próximos 80 (oitenta) anos. E isso não é tudo. As águas mais quentes tornarão os oceanos mais ácidos, o degelo do permafrost[2] liberará números elevadíssimos de gases de efeito estufa na atmosfera e as frequências de ondas de calor marinhas podem variar de 3ºC (três graus célsius) a 4ºC (quatro graus célsius). Os efeitos afetarão a vida humana, ameaçando a segurança alimentar, impactando a biodiversidade e retirando milhões de pessoas de áreas costeiras e ilhas.[3]
Os países não estão alheios a este fenômeno ambiental. A pauta internacional vem lidando com o aumento da temperatura terrestre a décadas e importantes documentos político-jurídicos já foram elaborados, com destaque para a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, o Protocolo de Quioto e o recente Acordo de Paris. Em que pese os esforços desprendidos, a emissão de carbono e de outros gases de efeito estufa segue alta e, naquilo que diz respeito à elevação do nível das águas oceânicas, o relatório do IPCC aponta para uma aceleração com velocidade 2,5 (duas vezes e meia) maior do que a do século passado.
É justamente nesse cenário, no qual as preocupações da sociedade seguem crescendo e as respostas políticas não parecem ser suficientes, que surge um novo tipo de ação: as litigâncias climáticas. Para aqueles que a utilizam, a litigância climática pode desempenhar um papel essencial para a implementação de políticas públicas climáticas, tanto no Brasil quanto em outros países, em virtude de sua utilização estratégica para a modificação na forma de proteção e de implementação de direitos relacionados ao aquecimento global.
O Columbia University’s Sabin Center for Climate Change Law[4] é um centro de pesquisa que se dispôs a construir e uma base de dados global de casos de litigância climática. Dentro dos casos apresentados, chama atenção a ação proposta por 3 (três) cidades do Estado americano da Califórnia contra algumas das maiores empresas de petróleo, gás e carvão, como a Exxon, Chevron, Statoil e a Shell.
Os autores buscavam compensação na forma de uma indenização pecuniária pelos custos atuais e futuros de adaptação ao aumento do nível do mar vinculado às mudanças climáticas. Entre os argumentos apresentados está o de que que as emissões de gases de efeito estufa das atividades das empresas de combustíveis fósseis nas últimas 5 (cinco) décadas causaram – e ainda causarão – diretamente o aumento da elevação do nível do oceano e causaram bilhões de dólares em danos. Ainda não há o julgamento definitivo da causa.
De qualquer forma, diante da constatação de que os compromissos internacionais assumidos e as políticas climáticas existentes não estão se traduzindo em resultados na qualidade e na velocidade necessárias, a utilização de outras estratégias parece ser bastante bem-vinda. Principalmente se se mostrarem aptas a solidificarem as formas de proteção de direitos e a implementarem medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.