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17 junho 2020

A importância do não esquecimento das manchas órfãs de óleo na costa brasileira

No final de agosto de 2019, o litoral brasileiro presenciou o aparecimento de inúmeras manchas de óleo. Desde seu aparecimento, essas manchas se espalharam pelo litoral nordestino e por centenas de localidades no Brasil, alcançando o Sudeste do país. David Zee, professor e pesquisador da UERJ disse ser a “maior área já afetada por um desastre do tipo”. Entretanto, mediante novos acontecimentos mundiais, boa parte da população e do governo parece não estar mais se lembrando do ocorrido.

Com o advento do Coronavírus (COVID-19), a atenção da população no Brasil se desviou das manchas órfã, havendo uma redução da circulação de informações sobre o caso. Contudo, é relevante não deixar o tema cair no esquecimento, pois há muitas ações a serem implementadas pelo governo.

Os impactos dessas manchas foram desastrosos. Segundo o artigo “Oil spill in South Atlantic (Brazil): Environmental and governmental disaster” publicado no volume 115 da Marine Policy, o dano foi significante, atingindo mais de 55 unidades de conservação, além de afetar o sistema tropical. Não somente danos ambientais, mas os danos econômicos foram substanciais. A exemplo, mais de 65 mil pescadores ficaram incapazes de realizar seus trabalhos. Esta impossibilidade tornou necessário a permissão adiantada de os pescadores poderem retirar seu seguro-defeso, que é usual para quando fica proibida a pesca. A permissão originada da Medida Provisória nº 908/2019 totaliza cerca de R$130 milhões (cento e trinta milhões de reais) que o governo deverá arcar para manter estes grupos protegidos. Os pagamentos iniciaram em 16 de dezembro de 2019 e foram feitos em duas parcelas de R$ 998,00 (novecentos e noventa e oito) para cada pescador que tinha direito.

Ainda sobre os danos econômicos, notou-se certo abalo no turismo. Ainda que, segundo Fernando Capez, diretor-executivo do Procon-SP afirme a inexistência de responsabilidade legal das empresas em ressarcir o dinheiro gasto, a possibilidade de negociar o cancelamento sem acarretar multas fez com que muitos turistas cancelassem. Destaca-se que, mesmo a redução no turismo sendo menor do que o que foi esperado, não há de se negar que a existência de dano é motivo suficiente para exigência de atitudes mais céleres do Estado.

Quanto à responsabilidade sobre o derramamento, depoimentos do coordenador-geral do Centro Nacional de Monitoramento e Informações Ambientais (Cenima), Pedro Alberto Bignelli, demonstram a rejeição da suposição da responsabilidade do navio grego Boubolina. Esta rejeição, todavia, contraria a afirmação da Polícia Federal, sobre o responsável. Segundo o coordenador-geral, o navio teria derramando substância alheia a que efetivamente contaminou a costa brasileira e que as imagens de satélites comprovam a isenção de responsabilidade da empresa sobre o caso em questão. Entretanto, quando se examina minuciosamente sua fala, entende-se que os meios de investigação utilizados pela Polícia não foram eficazes para identificar um responsável. Os esforços a fim de identificar o causador do sinistro não podem cessar, sendo necessário não somente o desejo por descobrir quem deu causa ao dano, mas também financiamento para que os mecanismos de busca sejam mais eficazes e precisos.

Segundo Nota à Imprensa divulgado pela Marinha, as ações de limpeza do Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA), formado pela Marinha do Brasil, Agência Nacional de Petróleo (ANP) e pelo IBAMA, se encerraram em 14 de janeiro de 2020, por acreditarem que “a limpeza natural pode ser menos danosa ao ambiente do que técnicas ativas de limpeza”. Instalou-se, portanto, técnicas de monitoramento feitas por pontos térmicos. Iniciou-se, a partir disso, o denominado “ASPIRANTEX-2020” que ocorreu conjuntamente com a 3ª Fase da Operação “Amazônia Azul – Mar Limpo é Vida” a fim de monitorar e conter os danos gerados pelas manchas órfãs de óleo.

Por fim, a não ativação do Plano Nacional de Contingência (PNC) para combater o aparecimento de manchas órfãs gera algumas preocupações. Destaca-se que o Decreto Presidencial 9.759/2019 dificultou a possibilidade da efetivação do PNC, na medida que não somente extinguiu alguns colegiados mas também limitou por meio de regras e diretrizes sua atuação. Tais dificuldades alcançaram os colegiados que seriam criados pelo PNC, fazendo com que este não pudesse atuar em sua integridade. Ainda que o GAA tenha sido formado, sua extinção precoce antes da resolução do sinistro ambiental torna necessário que o governo, em face deste caso, tenha uma atuação mais célere a fim de resolver as questões que ficaram em aberto, como quem seria o responsável pelo aparecimento das manchas.

Conclui-se, então, que em face de todos os danos gerados, sejam eles no meio ambiente ou na esfera econômica, o não esquecimento das manchas órfãs de óleo tornam-se necessários. A atuação morosa e desintegrada do governo em face do sinistro demonstra ser imprescindível que a população, como alvo e fim a que as atuações da administração pública se destinam, exija a resolução do caso para revelar a causa do dano. Ainda que cercado de novas questões, como o COVID-19, não há de se deixar que tamanho desastre seja tido como resolvido até que todas as questões sejam efetivamente respondidas.

 

 

Notícia produzida por Gabriel Morais de Souza Santos, estagiário do IBDMAR, sob a supervisão da Prof. Carina Oliveira, Professora da Faculdade de Direito da UnB. Colíder do Gern-UnB.

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