Nossos mares e a água de lastro
Por Milena Barbosa de Melo
Doutora e Mestre em Direito Internacional pela Universidade de Coimbra, Portugal. Professora Universitária. Diretora acadêmica da ANEED
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, estabelecida em Montego Bay (Jamaica), muito embora tenha especificado com bastante propriedade vários elementos essenciais para o processo de proteção e conservação dos recursos marinhos, ainda foi possível identificar a ausência de alguns elementos que são demasiadamente importantes para o sistema de proteção do meio ambiente, nomeadamente, as questões que se relacionam com água de lastro.
Apesar de a água de lastro ser um elemento eminentemente importante para trazer segurança no âmbito da navegação dos navios cargueiros, o seu uso impõe danos para o meio ambiente marinho. Tudo ocorre porque o líquido (água) utilizado nos tanques são originários de locais que, muitas vezes, possuem um grande nível “de” insalubridade, visto que, a água que é estocada nos tanques dos navios para garantir a sua estabilidade, pode conter espécies vegetais e animais endémicas e resíduos tóxicos, que ao atracar em portos estrangeiros poderá causar danos e contaminação ambiental no momento da troca de água, ocorrido no ato da estocagem e novas mercadorias.
Imaginem a quantidade de navios cargueiros em pleno funcionamento e, observem que, em cada navio, existe uma quantidade considerável de água de lastro que poderá contaminar vários litorais pelo mundo. Inclusive a ANVISA apresentou um estudo em que aponta um índice altíssimo de contaminação na água de lastro onde 71% das amostras dos navios estrangeiros, em alguns portos no Brasil, apresentavam água contaminada. Por isso, no intuito de suprir a lacuna apresentada pela CONVEMAR, a Organização Marítima Internacional passou a liderar a elaboração de um texto convencional que estabelece a regulamentação do uso da água de lastro pelos navios, nomeadamente a Convenção de Gerenciamento de Água de Lastro (BWM). Atualmente observa-se que 90,98% não apenas assinaram, mas se tornaram signatários da referida convenção internacional.
O objetivo central do referido texto que está em vigor desde 2017 é tão somente impedir a propagação de espécies aquáticas que sejam consideravelmente invasivas. E, portanto, os países signatários do documento deverão aplicar as exigências aos navios, de maneira que, a água de lastro venha a ser trocada, ao menos, com uma distância de 200 milhas da costa do país e, ainda, com 200 metros de profundidade.
Ocorre que, muito embora seja uma medida necessária para o meio ambiente marinho, o que se observa é uma grande preocupação por parte do setor de transportes marítimos em geral, em virtude do grande impacto financeiro e, ainda, técnico que vem tornar inviável as exigências observadas na Convenção. A questão reside tão somente na possibilidade de que muitos dos navios que já estão em rota não possuam a técnica adequada. E, portanto, ao aplicar a técnica exigida irá apresentar um atraso significativo no desenvolvimento das operações comerciais em cerca de 80%.
Entretanto, muito embora exista o conflito real, não se pode olvidar a importância suprema da proteção ao meio ambiente. E, portanto, deve prevalecer a proteção do meio ambiente marítimo, como uma forma segura de garantir qualidade de vida às populações. O preço pela inobservância aos preceitos naturais e, em especial, pela sua importância pode nos levar a caminho sem volta e já temos sido punidos pelos danos ambientais causados. Chegou a hora de valorizar a vida. Que a Convenção BWM seja cumprida!