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28 maio 2020

A Lei Geral de Proteção de Dados para as Empresas que Atuam no Mercado Internacional

por Carla Adriana C Gibertoni Fregona

Advogada e consultora jurídica, Sócia do escritório Pádua Advogados, especialista em Direito Marítimo, Mestre em  Relações Internacionais pela Universidade de Barcelona, Autora do livro Teoria e Prática do Direito Marítimo, Professora convidada em cursos de Pós graduação em Direito Marítimo e Direito Empresarial, Membro da Comissão de Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro da OAB/ES, do IBDMAR e ABDM.


Em uma sociedade cada vez mais movida e orientada por dados pessoais e empresariais nas redes, crescem movimentos para proteção do lado mais frágil da cadeia – o titular do dado. Esse é o objetivo da Lei Geral de Proteção aos dados pessoais (LGPD). Um novo pacto social é cada vez mais necessário, fundamentado na transparência e no respeito nas relações comerciais.

General Data Protection Regulation (GDPR), em vigor desde maio de 2018 na Europa, estabeleceu regras para coleta e uso de dados pessoais em 28 países, prevendo duras punições para entidades públicas ou privadas que não cumprirem suas diretrizes em todo continente europeu.

Com seu formato abrangente, ela também engloba as organizações que fazem negócios com seus cidadãos em qualquer parte do mundo e, somada aos escândalos de vazamentos de dados de grandes empresas, despertou a urgência de uma adequação internacional. Daí a enorme importância de uma regularização para todos os personagens que atuam no cenário internacional e que possuem vínculos contratuais e comerciais com organizações, públicas ou privadas, daqueles Estados.

Diversos países têm implementado “as regras do jogo” para a coleta e uso de dados pessoais, inclusive muitos na América Latina, como Argentina, Chile e Uruguay. Mas o Brasil ainda não tinha formalizado seus parâmetros. Por isso, sob a mira dos players que atuam no cenário mundial, inspirada na GDPR, foi criada a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Sancionada em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) aumenta a privacidade e proteção de dados pessoais e define o poder das entidades regulamentadoras para realizar a fiscalização das organizações.

A entrada em vigor da lei é um ponto que merece destaque no presente momento.

Originalmente, a LGPD (Lei n. 13.709/2018) entraria em vigor em agosto de 2020. No início de abril, em decorrência da pandemia de COVID-19, o Senado Federal definiu a prorrogação do início da vigência da LGPD de agosto de 2020 para janeiro de 2021. Ainda em abril, a Medida Provisória n. 959/2020 definiu que a Lei passaria a valer apenas em maio de 2021. Recentemente, o Senado voltou atrás e manteve a previsão original, ainda para 2020 ao votar o projeto que cria regras transitórias por conta da pandemia do novo coronavírus (COVID-19). O texto, no entanto, prevê que as multas para quem descumprir as regras começarão a ser aplicadas apenas em agosto de 2021.

A data, entretanto, ainda não está definida, isso porque o Projeto segue agora para sanção presidencial. Caso a MP 959/20 seja rejeitada, a Lei Geral de Proteção de Dados passa a valer já nos próximos meses.

A semelhança com a GDPR é um fator positivo, que contribui para que empresas estrangeiras tenham mais confiança no mercado brasileiro, aumentando a credibilidade e incentivando novas relações comerciais.

A LGPD também consolida, atualiza e torna mais robusta as regras de coleta e uso de dados pessoais que estavam de alguma forma previstas em outras legislações, como no Marco Civil da Internet, no Código de Defesa do Consumidor e na própria Constituição Federal.

A partir da entrada em vigor, toda empresa deverá garantir a segurança dos dados pessoais e comunicar todo e qualquer incidente.

Adequar-se à LGPD será uma questão de sobrevivência em um mercado cada vez mais global e que exige a transparência dos players em todos os setores da economia.

Empresas de todos os portes, públicas ou privadas, que coletam dados pessoais (sejam de clientes, fornecedores ou funcionários) devem estar de acordo com a legislação e o órgão regulatório será a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados).

O espírito da lei foi proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, com base na boa-fé. Com isso, todo o tipo de tratamento de dados pessoais deve cumprir uma série de princípios e fundamentos, dentro do ciclo de vida do uso da informação.

Os efeitos da lei atingem em cheio as estruturas das organizações e suas relações comerciais no momento em que a responsabilidade pela proteção dos dados pessoais passa a ser responsabilidade da empresa (e parceiros) e não do usuário.

Trata-se de uma transformação cultural que vai gerar maior transparência e tem impacto reputacional muito relevante.

No início de maio, vivenciamos um julgamento, no mínimo, histórico, quando o plenário do Supremo Tribunal Federal suspendeu, por 10 votos  a um, a eficácia da Medida Provisória 954/2020, que determinava que as operadoras de telefonias entregassem ao IBGE nome, endereço e telefone de todos os brasileiros que possuem uma linha fixa ou móvel. A maioria dos ministros do Supremo considerou que a MP feria princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), como  finalidade, adequação (à necessidade), transparência e segurança, ao não definir claramente o escopo para o uso dos dados, pedir mais dados do que o necessário para a elaboração da pesquisa e não adotar medidas de proteger os dados de vazamentos e usos indevidos.

É evidente que esse julgamento reconheceu uma série de direitos, sob o prisma constitucional, que vão ter impacto para todos, no setor público e no privado. Isso significa dizer que a proteção de dados chegou à Constituição e a lei já está sendo aplicada a todos. Por isso, esse tema deve ter prioridade na pauta de todas as pessoas jurídicas que atuam no cenário econômico.

Ao adotar sistemas e processos inteligentes para o gerenciamento e análise de dados, as companhias ganham muito mais do que apenas a conformidade com a LGPD. Elas reforçam suas possibilidades de negócios, com novas ideias e com informações que podem realmente contribuir para o desenvolvimento de suas operações. Além de se apresentarem aptas e qualificadas a negociar num cenário internacional.

Este é um momento diferenciado por conta das mudanças promovidas pelo coronavírus, mas certamente quem conseguir sair à frente terá uma enorme vantagem competitiva. As decisões de hoje farão a diferença no novo mundo que teremos após o período de quarentena.

O sinal de alerta está ligado, ampulheta virada. Em breve, seja em agosto de 2020 ou 2021, a LGPD estará em plena vigência. Compreender que se trata de uma realidade que irá afetar profundamente os mais variados setores é o primeiro passo. Como diria Geraldo Vandré “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”, afinal, nesse caso, prevenir é melhor e mais econômico que remediar.

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