O Sudeste Asiático como destino do lixo dos países desenvolvidos
Países desenvolvidos, como o Reino Unido, os Estados Unidos e o Canadá têm se aproveitado do “comércio internacional” para exportar parte de seus resíduos para países em desenvolvimento, principalmente na Ásia, onde a legislação ambiental é pouco restritiva. Por um bom tempo, a China exerceu o papel de principal destino das exportações de lixo vindo dos países do Norte ocidental, o que abrange plásticos usados, papéis, metais e até mesmo materiais tóxicos. Até 2017, só de resíduos plásticos para reciclagem, a China absorvia 56% do volume mundial. A importação desses resíduos, principalmente o plástico, era uma forma de se obter matéria-prima para as manufaturas chinesas. No entanto, em 18 de julho de 2017, o país oriental notificou a Organização Mundial do Comércio que iria impor proibições a certos tipos de resíduos tóxicos que estariam afetando seriamente o meio ambiente do país e comprometendo a saúde de seu povo.
Com essas barreiras se tornando efetivas no início de 2018, os países desenvolvidos identificaram outro destino para os seus despejos: o sudeste asiático. Países como Indonésia, Malásia e Vietnã já recebiam volumes significativos de lixo provenientes de outros países. Essas importações, crescentes a partir dos anos de 1990, por meio de incentivo e permissão para o recebimento dessas cargas por empresas nacionais de reciclagem, tornando-se assim fonte de matéria-prima para a indústria local. Porém, com a vigência das barreiras chinesas, os países do Sudeste Asiático passaram a receber volumes ainda maiores de resíduos, o que tem se tornado causa de danos significativos ao meio ambiente local, atingindo a rede hidrográfica e, consequentemente, o espaço marinho. A poluição marinha por plástico é um dos mais complexos desafios contemporâneos para a comunidade internacional.
Com a crescente importação do lixo de países desenvolvidos a níveis alarmantes em 2018, os governos de países como a Indonésia, a Malásia, o Vietnã e a Tailândia têm adotado medidas para diminuir a poluição em cada país, instituindo internamente barreiras jurídicas similares às que a China pôs em prática no mesmo período. No Vietnã, desde julho de 2018, preocupado com os impacto ambientais da atividade, o governo tem impedido a emissão de licenças para a importação de lixo, reprimindo os contrabandos de lixo como forma a impedir uma maior acumulação de contêineres nos portos do país. O governo de Hanói foi seguido pelo de Bangkok, que, algumas semanas depois, proibiu a importação de 432 tipos de lixo eletrônico.
O volume de lixo acumulado no Sudeste Asiático, proveniente do Ocidente, ainda preocupa muito os países da região. Vários eventos recentes têm confirmado que a tendência é um reforço da cooperação internacional para responsabilizar interna e internacionalmente quem pretender se beneficiar desse comércio. Na Malásia, país que se tornou o maior importador de plástico após a entrada em vigor das barreiras chinesas, a Ministra de Energia, Ciência, Tecnologia, Meio Ambiente e Mudança Climática, Yeo Bee Yin, afirmou, em maio passado, que a Malásia não se tornará em uma lixeira dos países desenvolvidos e anunciou a devolução de 3.000 toneladas de lixo aos países de origem. Internamente, o governo de Kuala Lumpur vem fechando fábricas ilegais de reciclagem de plástico, enquanto que, internacionalmente, tem estabelecido barreiras à importação de lixo, tendo como fundamento jurídico o princípio da prevenção de danos socioambientais.
No mesmo quadro, na Indonésia, em 14 de junho de 2019, o Escritório Alfandegário de Batam determinou a devolução para os Estados Unidos de cinco contêineres que se encontram no Porto de Tanjung Perak, o segundo porto mais movimentado do país, localizado no leste de Java. Em decorrência desses fatos, o Ministro do Meio Ambiente e Florestas da Indonésia, Siti Nurbaya Bakar, reafirmou o compromisso de reexportar as cargas que entrarem ilegalmente no país, além de investigar as violações cometidas e punir os responsáveis.
Além disso, as autoridades indonésias realizaram a averiguação do conteúdo de outros 65 contêineres, identificando ali a presença de resíduos fora dos padrões instituídos pela Lei nacional. Em 1º de julho, o Ministro Siti Nurbaya Bakar recomendou ao Escritório Alfandegário de Batam que ordenasse a devolução aos países de origem (Austrália, Estados Unidos e países europeus), por parte dos importadores, de 49 dos 65 contêineres, devido à presença de resíduos tóxicos.
Dias depois, em 30 de julho, por ação do mesmo Escritório Alfandegário de Batam (Indonésia), que comprovou a presença de materiais perigosos e tóxicos nas cargas importadas pela empresa PT Arya Wiraraja Plastinindo, sete contêineres foram devolvidos a França e Hong Kong. A Indonésia se junta assim aos outros países do Sudeste Asiático reagindo para impedir a acumulação de resíduos vindos dos países desenvolvidos.