Corte Internacional de Justiça analisa disputa marítima entre Somália e Quênia
Em 25 de junho de 2019, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), divulgou em seu site a realização de audiências públicas em Haia, entre os dias 09 e 13 de setembro de 2019, nos quais será discutida a disputa territorial entre a Somália e o Quênia, no Oceano Índico.
A Somália instaurou, em 2014, um processo contra o Quênia perante a Corte, solicitando que determinasse, com base na lei internacional, o curso completo da fronteira marítima única que dividia todas as áreas marítimas da Somália e do Quênia no Oceano Índico, incluindo a plataforma continental para além de 200 milhas náuticas. Como base para a jurisdição do Tribunal, a Somália invocou as declarações reconhecendo a jurisdição do Tribunal como obrigatória feita pelos dois Estados. Quênia, no entanto, levantou duas objeções preliminares: uma relativa à jurisdição da Corte, a outra a admissibilidade da Petição.
O CASO
Em 28 de agosto de 2014, o Governo da República Federal da Somália apresentou na Secretaria do Tribunal um requerimento de instauração de processo contra a República do Quénia relativo a um litígio “o estabelecimento da fronteira marítima única entre a Somália e o Quénia, no Oceano Índico, delimitando o mar territorial, zona econômica exclusiva e plataforma continental, incluindo a plataforma continental para além de 200 milhas náuticas ”.
Em 7 de abril de 2009, o Ministro de Relações Exteriores do Quênia e o Ministro de Planejamento Nacional e Cooperação Internacional da Somália assinaram um “Memorando de Entendimento entre o Governo da República do Quênia e o Governo Federal de Transição da República da Somália para conceder uma à outra não-objeção em relação a submissões sobre os limites externos da plataforma continental além de 200 milhas náuticas para a Comissão sobre os limites da plataforma continental ”. Um mês depois, o Quênia depositou na Comissão sobre os Limites da Plataforma Continental (CLCS) sua apresentação com respeito à plataforma continental além de 200 milhas náuticas.
Durante as audiências orais, realizadas em setembro passado, o Quênia defendeu que o Memorando de Entendimento assinado por ambos os países em abril de 2009 obrigou a Somália a resolver o conflito por meio da CLCS. Por essa razão, o Quênia solicitou ao tribunal internacional que se abstivesse de declarar jurisdição sobre o assunto.
A Corte analisou o Memorando, em especial, o seu sexto parágrafo, e se este poderia ser interpretado no sentido de impedir que as Partes chegassem a um acordo sobre sua fronteira marítima, ou que qualquer um deles recorra a procedimentos de solução de controvérsias sobre seu conflito marítimo, antes de receber as recomendações da CLPC. Em relação ao Memorando, a Corte destacou que, em primeiro lugar, seu objetivo e propósito era constituir um acordo de não-objeção, permitindo que a CLPC fizesse recomendações, apesar da existência de uma disputa entre as Partes em relação à delimitação da plataforma continental.
Em segundo lugar, o sexto parágrafo diz apenas respeito à plataforma continental, e não a toda a fronteira marítima entre as Partes, o que sugere que não criou um procedimento de resolução de litígios para a determinação dessa fronteira. Além disso, que o memorando de entendimento deixa repetidamente claro que o processo que leva à delineação dos limites exteriores da plataforma continental para além de 200 milhas marítimas não deve prejudicar a delimitação da fronteira marítima entre as Partes, o que implica consistentemente com a jurisprudência desta parte de que a delimitação pode ser realizada pela Corte, independentemente de uma recomendação da CLPC.
A Corte analisou ainda que o texto do sexto parágrafo do Memorando reflete o do parágrafo 1 do artigo 83 da UNCLOS, sugerindo que as Partes pretendiam reconhecer o curso usual que a delimitação tomaria sob esse artigo, a saber, participar de negociações com vistas a chegar a um acordo, e não prescrever um método de solução de controvérsias. E por fim, que as Partes aceitam que o sexto parágrafo não as impediu de realizar tais negociações, ou de alcançar determinados acordos, antes de obter as recomendações da CLPC.
TEXTO: LAÍSA BRANCO